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Julgamento do caso PC é histórico, mas consagra impunidade


É histórico o resultado do julgamento relativo às mortes de Paulo César Farias e Suzana Marcolino.
O tribunal do júri recusou a versão estabelecida pela polícia de Alagoas em 1996, segundo a qual Suzana teria assassinado o namorado e se suicidado. E consagrou a conclusão do inquérito, também da Polícia Civil alagoana, de 1999: o casal fora vítima de duplo homicídio. Não houve "crime passional".
Defensores da tese do duplo homicídio do caso PC celebram decisão
Júri diz que ex-seguranças são inocentes e que Suzana não matou PC Farias
Foi a mesma convicção do Ministério Público, na denúncia de 1999. Quando pronunciou os réus, a Justiça considerou haver provas para que eles fossem submetidos a júri popular. O júri rejeitou o relato do primeiro grupo de peritos que atuou no caso. De acordo com o primeiro laudo, Suzana disparou contra PC e contra si própria.
Os jurados adotaram a interpretação da segunda equipe de especialistas, que produziu estudos em 1997 e 1999, afirmando que ocorrera duplo homicídio.
Se é possível sustentar que o júri constatou o óbvio, tão ululantes são as provas de dois homicídios, o julgamento consagra a impunidade.
Os quatro réus, todos policiais militares que trabalhavam como seguranças de PC, foram absolvidos.
É difícil acreditar que os PMs não tenham ouvido os tiros em 1996, mas suas condenações provocariam um incômodo: seriam punidos peixes pequenos, sem a identificação do mandante.
Duas pessoas foram assassinadas, mas ninguém foi punido pelos crimes. Desde as mortes, passaram-se 17 anos, numa demora que emperra a Justiça. Provas foram destruídas, e a investigação no calor do fato foi deficiente.
O julgamento oferece lições para o jornalismo. Não cabe à imprensa patrocinar laudos periciais, substituir o papel da Justiça e decretar arbitrariamente o encerramento de casos controversos.
Até o começo de 1999, existiam dois laudos divergentes. Em 23 de março daquele ano, o promotor encarregado do caso disse que pediria o arquivamento do processo, por ausência de provas de duplo homicídio. No dia seguinte, a Folha publicou fotografias que contradiziam as perícias que bancavam a versão de Suzana assassina e suicida.
Então, o Ministério Público retomou a investigação, e houve a reviravolta.
Quando especialistas se confrontam, o jornalismo deve buscar de modo autônomo informações que possam esclarecer quem tem razão.
Ao receber a notícia do resultado, lembrei-me do jornalista Ari Cipola. Com o colega Paulo Peixoto e eu, Cipola participou da investigação da Folha sobre o caso PC em 1999.
Cipola morava em Maceió, foi intimidado e precisou ser protegido pela Polícia Federal. Morreu de causas naturais em 2004, aos 42 anos. Pena que ele não viveu para assistir ao julgamento.
MÁRIO MAGALHÃES é jornalista, ex-ombudsman da Folha e autor da biografia "Marighella "" O guerrilheiro que incendiou o mundo" (Companhia das Letras)
MATERIA UOL.COM.BR

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