O projeto ainda prevê que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios deverão atuar em conjunto na organização de políticas públicas e campanhas de conscientização sobre o castigo físico ou tratamento cruel e degradante contra criança ou adolescente
O
Plenário do Senado aprovou, na noite desta quarta-feira (4), em votação
simbólica, o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 58/2014. O projeto foi
aprovado mais cedo na Comissão de Direitos Humanos e Legislação
Participativa (CDH) e foi encaminhado direto ao Plenário. Agora, o texto
segue para sanção presidencial.
A
proposta, que vinha sendo chamada de Lei da Palmada desde que iniciou a
sua tramitação, foi rebatizada para “Lei Menino Bernardo”. O novo nome
foi escolhido em homenagem ao garoto gaúcho Bernardo Boldrini, de 11
anos, cujo corpo foi encontrado no mês de abril, enterrado às margens de
uma estrada em Frederico Westphalen (RS). O pai e a madrasta são
suspeitos de terem participação na morte do garoto.
O
presidente do Senado, Renan Calheiros, disse que o projeto é importante
e destacou que a data de 4 de junho é destinada a comemorar o Dia
Internacional das Crianças Vítimas de Agressão. Para Renan, o Senado
votou uma lei de interesse de toda a sociedade brasileira, pois o texto
poderá ajudar na harmonização da relação de pais e filhos. A
apresentadora Xuxa Meneghel, defensora da lei, a ministra da Secretaria
das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e a ministra do Turismo,
Marta Suplicy, acompanharam a votação. Mais cedo, em visita ao
presidente Renan Calheiros, Xuxa pediu que as crianças sejam educadas
sem violência.
-
A lei vai impedir que usem violência, é só isso. Pode educar de
qualquer maneira, sem o uso da violência. A pessoa que deu uma palmada
vai ser presa? Não! Nós queremos mostrar que as pessoas podem e devem
ensinar uma criança sem usar violência. É só isso que estamos pedindo. É
isto que a lei faz: que a criança seja vista com os mesmos direitos que
nós, adultos – pediu Xuxa.
Sociedade de paz
Para
a senadora Ana Rita (PT-ES), relatora da matéria na CDH, a razão
primordial do projeto é proteger crianças e adolescentes do tratamento
degradante. Segundo a senadora, o projeto não busca penalizar, mas sim
encaminhar os pais, quando for o caso, a cumprirem determinados
procedimentos, como cursos ou orientação psicológica. Ela acrescentou
que o Conselho Tutelar está respaldado para agir. Dependendo da
situação, o conselho poderá inclusive acionar a polícia.
A
senadora reconheceu que o projeto é polêmico, e lembrou que o ato de
bater é cultural e frequente em muitas tradições. Ana Rita, no entanto,
enfatizou que essa cultura precisa ser enfrentada. Ela fez questão de
destacar que a lei não é punitiva, mas um texto que procura educar as
pessoas e garantir que as crianças não sejam educadas de forma
agressiva. Na visão de Ana Rita, o projeto propõe repensar valores que
não combinam com uma sociedade justa e solidária.
-
Esta lei contribui para que tenhamos cidadãos mais preparados para o
futuro. Se queremos uma sociedade melhor e de paz, precisamos formar
essa nova geração com novos princípios e valores, com cidadãos mais
tolerantes e que suportem melhor uns aos outros – declarou.
Na
opinião do senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), o projeto tem
inspiração científica e contempla a “triste realidade” da violência
contra as crianças. Ele informou que os dados do Brasil apontam 130 mil
casos de violação de direitos humanos de crianças só em 2012. O senador
Mário Couto (PSDB-PA) disse que a aprovação do texto é um “passo à
frente” e pediu uma gestão mais eficiente para cuidar das crianças
carentes.
A
senadora Lídice da Mata (PSB-BA) pediu uma nova cultura na educação de
filhos e disse que “palmada não causa lesão”. Os senadores Eduardo
Suplicy (PT-SP), Cristovam Buarque (PDT-DF), Rodrigo Rollemberg (PSB-DF)
e Antônio Carlos Valadares (PSB-SE) também elogiaram o texto. Para o
senador Humberto Costa (PT-PE), a lei é necessária para a que se mude a
mentalidade do uso da violência na educação de crianças.
-
Esta lei vai mudar os costumes e a cultura. Vamos avançar. Queremos
construir uma sociedade em que todos tenham direitos e que esses
direitos sejam praticados desde muito cedo – disse Humberto.
Tempo
De
acordo com o senador Magno Malta (PR-ES), cerca de 80% do projeto já
estão contemplados no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O
senador criticou a subjetividade do projeto e pediu clareza no texto
para separar “educação de filhos” da “violência”. Malta lembrou que uma
de suas batalhas de vida é lutar contra a pedofilia e pela recuperação
de dependentes químicos, assim, teria legitimidade para tratar do
assunto. O parlamentar leu um artigo do jornalista Ricardo Kostcho, com
críticas à Lei Menino Bernardo. Segundo o artigo, as pessoas vêm
diminuindo o uso da palmada, mas nem por isso a violência deixou de
crescer.
Magno
Malta ainda afirmou que a Justiça precisa agir, em casos de denúncias
de abusos, no tempo máximo de 24 horas – para evitar que muitos
agressores escapem. Ele reclamou que o texto do projeto “dormiu quatro
anos na Câmara”, mas não foi debatido de forma profunda no Senado. Ele
fez questão de dizer que “não desaprova” a iniciativa, mas registrou que
teve apenas “uma hora” para examinar o texto.
- O que o Senado está fazendo é um crime contra ele mesmo – declarou.
Medidas
O
projeto inclui dispositivos no ECA (Lei 8.069/90), para garantir o
direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o
uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou degradante. O texto
define castigo como a “ação de natureza disciplinar ou punitiva com o
uso da força física que resulte em sofrimento físico ou lesão à criança
ou ao adolescente”. O tratamento cruel ou degradante é definido como
“conduta ou forma cruel de tratamento que humilhe, ameace gravemente ou
ridicularize a criança ou o adolescente”.
Segundo
a proposta, os pais ou responsáveis que usarem castigo físico ou
tratamento cruel e degradante contra criança ou adolescente ficam
sujeitos a advertência, encaminhamento para tratamento psicológico e
cursos de orientação, independentemente de outras sanções. As medidas
serão aplicadas pelo conselho tutelar da região onde reside a criança.
Além disso, o profissional de saúde, de educação ou assistência social
que não notificar o conselho sobre casos suspeitos ou confirmados de
castigos físicos poderá pagar multa de três a 20 salários mínimos, valor
que é dobrado na reincidência.
Matéria acritica.com.br
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